Aprenda a ser criativo com Ken Robinson
Posted On segunda-feira, 14 de março de 2011 at às 21:08 by José Felipe Jr.Para o especialista em criatividade, inovação e pessoas, o pensamento criativo não vem do esforço individual, mas do trabalho em equipe. Confira a entrevista completa.
Nomeado cavaleiro do reino pela rainha Elizabeth II em 2003, Sir Ken Robinson é especialista em criatividade, inovação e pessoas. Assessor de empresas e governos sobre estratégias para desenvolver a criatividade e autor de Out of our minds (ed. Capstone ) e The element (ed. Vikin g), ele diz que o pensamento criativo não vem do esforço individual, mas do trabalho em equipe
Como o sr. define o conceito “criatividade”?
Há três palavras-chave nesse assunto. A primeira é “imaginação”, a fonte de criatividade. A imaginação é nossa capacidade mais extraordinária, que nos permite trazer à mente algo que não está disponível para ser captado por nossos sentidos. Com imaginação podemos reviver o passado, assumir o lugar de outra pessoa e ter empatia com ela, ou antecipar o futuro –não prever, mas antecipar diferentes possibilidades.
Tudo o que é distintivamente humano provém do poder da imaginação. A segunda palavra é “criatividade”, que consiste em colocar a imaginação para trabalhar. Outra maneira mais formal de definir a criatividade: o processo de geração de ideias originais que tenham valor. Você pode ser criativo em matemática, música, artes, na gestão de uma empresa, na condução de uma família. Tudo é fonte potencial de pensamento criativo.
“Inovação” é a terceira palavra-chave. Significa colocar as boas ideias em prática. Muitas empresas estão interessadas em inovação, mas elas não podem inovar da noite para o dia. Antes precisam ter um processo de criatividade e, para isso, devem incentivar e promover a imaginação. Nesse ponto várias organizações e indivíduos falham: deixam de alimentar a imaginação.
Muitas vezes me pergunto como é possível incentivar a imaginação, e respondo que uma forma é com novas experiências. Se você nunca foi a uma galeria de arte, visite alguma; se nunca viu balé, assista a um espetáculo; se não costuma ir a eventos esportivos, vá a um; se sempre segue o mesmo caminho de casa para o trabalho, tente um diferente. Estimule sua imaginação com um novo fluxo de ideias.
Algumas empresas têm políticas específicas para estimular a imaginação dos funcionários, como o estúdio de animação Pixar, que criou um programa de treinamento chamado Pixar University, com palestras sobre diversas matérias realizadas nos escritórios da empresa.
Os funcionários podem passar até quatro horas por semana em qualquer curso, como os de antropologia ou egiptologia; não é necessário que o assunto esteja diretamente relacionado com seu trabalho cotidiano.
Um efeito dessa política é que ela gera um fluxo constante de novas ideias. Como é permitido freqüentar qualquer curso, funcionários de diferentes setores costumam se encontrar em seminários e conferências, o que ajuda a criar uma cultura coesa,
um sentimento comum a todos.
Mas como passar da imaginação para a criatividade e inovação?
A criatividade é um processo diligente. Você pode ser criativo em qualquer área. A Pixar é criativa no negócio do entretenimento; a Procter & Gamble, no de produtos de consumo. Sua estratégia de inovação é muito diferente da Pixar. Incentiva a colaboração entre funcionários de diferentes áreas, com a contribuição
de pessoas e pesquisadores externos. A Cisco Systems, por sua vez, forma equipes interdisciplinares, com forte ênfase na colaboração.
As empresas cujos departamentos operam de maneira isolada e onde as pessoas só falam de sua especialidade estão menos propensas a acender a centelha da criatividade do que as que incentivam o intercâmbio de ideias entre funcionários de diferentes setores e de distintas especialidades.
Em suma, para incentivar uma cultura de inovação, deve-se reconhecer que o pensamento criativo não vem do esforço individual, e sim da colaboração,
do trabalho em equipe, de combinar as ideias das pessoas.
Além das equipes interdisciplinares, algumas empresas estimulam a criatividade dando um tempo livre para que os funcionários pesquisem o que quiserem. Isso funciona?
É uma política inteligente, que dá bons resultados. A disciplina é necessária, mas são fundamentais também o descanso e as etapas de maturação, para que as ideias se desenvolvam.
Um exemplo simples: quando não conseguimos nos lembrar de um nome por mais que nos esforcemos, o melhor que podemos fazer é não pensar nisso e, meia hora mais tarde, acabamos nos lembrando espontaneamente. O pensamento intencional ocorre na parte frontal do cérebro; no entanto, ali também se formam conexões inconscientes e boa parte das ideias criativas.
Qual é o papel da emoção no desenvolvimento da imaginação?
A emoção ganhou má fama no século 18, durante o Iluminismo, quando os filósofos deliberadamente tentaram minimizar seu impacto. Com Descartes, os grandes escritores da época argumentaram que, para a aquisição de conhecimentos, temos de aplicar um rigoroso processo de raciocínio lógico respaldado por evidências empíricas.
O filósofo Hume dizia até que era preciso erradicar os sentimentos do processo lógico, porque eles distorciam a verdade. Temos vivido com essa ideia desde então. Crescemos pensando que há sentimentos de um lado e racionalidade de outro e que podemos confiar no intelecto, mas não nos sentimentos. Assim, a psiquiatria tem se dedicado a corrigir os efeitos negativos das emoções. Entretanto, as emoções também têm efeitos positivos, e cada vez mais se fala dos benefícios da felicidade.
O sr. afirma que a maioria das pessoas acha que não é criativa ou inteligente. A que atribui isso?
As pessoas têm uma visão muito limitada da inteligência, acreditando que é uma espécie de pensamento racional medido por testes de QI. Eu, ao contrário, defendo que a inteligência é muito diversificada e que existem maneiras de pensar diferentes.
Algumas pessoas pensam visualmente; outras, por meio do som ou do movimento; e outras, ainda, de forma matemática.
Os pintores têm ideias visuais; não se trata de tentar compensar a falta de habilidade verbal, nem de converter as sentenças em imagens. Os músicos escrevem textos e, em seguida, os transformam em notas musicais; eles pensam musicalmente. O cérebro humano é interativo. Fala-se muito dos hemisférios direito e esquerdo do cérebro, porém a ação real acontece nas conexões entre ambos. O cérebro não é um sistema mecânico, mas orgânico. Cada pessoa tem uma forma de pensar única. As grandes equipes criativas são as que reúnem indivíduos com diferentes experiências e habilidades, e convertem essas diferenças em ponto forte. De novo, a Pixar é um bom exemplo. Organiza equipes específicas para cada projeto e as dissolve quando o projeto termina, reorganizando novos grupos para as obras seguintes. Não é por ser do cinema que ela é criativa; é por fazer isso.
Fonte: HSM Management - Entrevista de Eduardo Braun publicada na Edição 83 – Novembro/Dezembro 2010, na página 8.